Escrever para quê?
Taí uma pergunta que persegue todo mundo que escreve. Com ela em mente que a editora Sandra Abrano colheu uma série de citações. Retirou trechos de entrevistas, artigos, reportagens, ensaios, romances e os reuniu numa mistura de livreto simpático com caderno de anotações.
Estão ali ideias de gente como Moacyr Scliar, Natalie Goldberg, Hemingway, Leonardo Padura e Ezra Pound. Passeei por “Escrever Para Quê?”, publicado pela Bandeirola, e pesquei algumas aspas de lá. Uma distração para este meio de feriado.
“No final ela morre e ele fica sozinho, ainda que na verdade ele já tivesse ficado sozinho muitos anos antes da morte dela, de Emilia. Digamos que ela se chama ou se chamava Emilia e que ele se chama, se chamava e continua se chamando Julio. Julio e Emilia. Emilia morre e Julio não morre. O resto é literatura” - trecho de “Bonsai”, de Alejandro Zambra (Cosac Naify, tradução de Josely Vianna Baptista).
“Escrever romances implica atrever-se a completar o monumental percurso que tira você de si mesmo e permite se ver no convento, no mundo, no todo. E depois de fazer esforço supremo de entendimento, depois de quase tocar por um instante na visão que completa e que fulmina, regressamos mancando para nossa cela, para o encerro da nossa estreita individualidade, e tentamos nos resignar e morrer” - trecho de “A Louca da Casa”, de Rosa Montero (HarperCollins, tradução de Paulina Wacht e Ari Roitman).
“O texto literário é um texto que também dá voz ao leitor. Quando escrevo, por exemplo: ‘A casa é bonita’, coloco um ponto final. Quando você lê para uma criança ‘A casa é bonita’, para ela pode significar que tem pai e mãe. Para outra criança, ‘casa bonita’ é a que tem comida. Para outra, a que tem colchão. Eu não sei o que é casa bonita, quem sabe é o leitor. A importância para mim da literatura é também acreditar que o cidadão possui a palavra. O texto literário convida o leitor a se dizer diante dele. Isso é o que há de mais importante para mim na literatura” - Bartolomeu Campos de Queiróz em entrevista a Rogério Pereira.
“Um livro não escrito é um delicioso universo de possibilidades infinitas. No entanto, basta você colocar uma palavra no papel para ele se tornar imediatamente algo concreto. Se colocar uma frase, já é meio caminho andado para ele ficar igual a qualquer porcaria de livro já escrito. Porém, nunca devemos permitir que os melhores expulsem os bons da pista. Na falta de genialidade, há sempre o talento. Pode-se ao menos tentar escrever algo que prenda a atenção do leitor - que o estimule, depois de ler o primeiro parágrafo, a dar uma olhada no segundo, e depois no terceiro” - trecho de “O Fantasma”, de Robert Harris (Record, tradução de Fabiano Morais da Costa).
“Se ouvirmos o que escrevemos, podemos procurar a cadência que ajudará uma frase a fluir. E o que dizem os jovens escritores sobre ‘encontrar a sua voz’? Bem, não vão encontrar muita coisa se não puserem os seus ouvidos para escutá-la. O som da sua escrita é uma parte fundamental do que fazem” - Ursula K. Le Guin em “Conversaciones Sobre la Escritura” (Alpha Decay, trecho traduzido por Sandra Abrano).
Outras citações sobre o tema são bem-vindas, só deixar nos comentários 🙂
Turma de leitores
“E para falar de outro prazer recente que também tem me causado essa sensação gostosa de pertencimento, eu não posso deixar de indicar o excelente ‘A Biblioteca no Fim do Túnel: Um Leitor em Seu Tempo’, do Rodrigo Casarin. Sempre fui fã da Página Cinco e tenho curtido muito reler os textos impressos, com as minhas tags e minha lapiseira, conversando mentalmente com o Rodrigo.
Posso dizer sem medo de errar que fui procurar a minha turma e encontrei”.
É bom ver “A Biblioteca no Fim do Túnel” encontrando a sua turma de leitores. Desta vez quem escreveu sobre meu livro foi a Tati Guedes, da Zero Pretensões e Sentimentos Aleatórios:
Oficina de Crônicas e Ensaios
Entre junho e julho irei ministrar uma oficina na LabPub sobre Crônicas e Ensaios. A ideia é misturar teoria e prática para que os participantes tenham uma boa noção de como trabalhar com esses gêneros.
As aulas serão online e ao vivo. Acontecerão às quartas e sextas, das 19h às 21h10. Aqui há mais informações.
Reconhecimento X Percepção
“‘As ideias que temos sobre as coisas que vemos já estão organizadas antes de encontrarmos essas coisas’, escreve MacCarnell. Em outras palavras, no turismo típico, o reconhecimento é mais forte do que a percepção. No fundo, há uma lógica em fotografar o que já foi fotografado; outras pessoas já emolduraram aquela paisagem para você”.
Vale também para a literatura, para os livros que pegamos mais para reconhecer o que já foi dito a respeito dele (clássicos e contemporâneos em grande evidência, sobretudo) do que para elaborar nossas próprias percepções.
O trecho é da Nevoeiro, newsletter da Carol Bensimon:
Contra pendejos proativos
“Então ele, com uma cara de bunda, me devolveu os destroços. Quando o artista foi embora, o meu amigo soltou a seguinte frase: ‘No hay nada peor que un pendejo con iniciativa’.
É isso, um pendejo, um tonto, um idiota proativo é um perigo em potencial. Portanto, pensem duas vezes antes de seguir conselhos do tipo ‘vai lá e faz’. Não, se você não souber fazer, não vá, não tente fazer. Chame alguém que saiba”.
É com humor que Ricardo Viel escreve sobre problemas da proatividade:
Paulo Coelho
“A beleza de uma história não está numa forma complicada de contá-la. Gosto como o narrador de ‘O Alquimista’ guia essa história, como se estivesse me contando um conto de fadas muito antigo, que ele sabe que eu já ouvi mil vezes, mas que vai me manter entretida mesmo assim.
Se literatura não for fundamentalmente entretenimento, eu não sei mais o que é”.
Aline Valek escreve sobre Paulo Coelho na Uma Palavra:
📢 O que mais rolou na Página Cinco
📝 Boom: O que revelam as cartas trocadas por Gabo, Llosa, Fuentes e Cortázar?
📝 Elogios em inglês comprovam: Machado de Assis é bom mesmo
📝 Rio Grande do Sul: Como dar uma força para o povo do livro
📝 Quando uma parte importante da história nubla nossa visão sobre alguém - resenha de “Uma Estrela Tranquila - Retrato Sentimental de Primo Levi”, de Pietro Scarnera (Martins Fontes)
🎙️ Por que o livro custa o que custa no Brasil? Papo com Nathan Matos:
Foi um prazer "pensar" esse livro e estamos felizes por encontrar ele por aqui, Rodrigo.
o resto é literatura? eu diria que tudo.