Acerto de contas com a infância
Na vida, na minha vida, futebol e literatura andam juntos
No final de maio eu estive na Feira do Livro do Colégio Miguel de Cervantes, aqui em São Paulo. Me chamaram para uma conversa sobre quadrinhos. O foco estava em “Escuta, Formosa Márcia”, do Marcello Quintanilha (Veneta), título trabalhado em sala de aula por algumas turmas.
Mais do que um papo com os jovens, aquele foi um acerto de contas com o Rodrigo do passado. Quando criança, passava em frente ao Cervantes quando ia para os jogos no Morumbi - o colégio fica a poucos metros do estádio. Sonhava em um dia estudar naquele lugar bonito, que carregava o nome do criador de Dom Quixote, que sempre me fascinou. Mais do que isso: sabia que estudar ali significaria estar sempre por perto do São Paulo, do estádio onde cresci, apesar de morar do outro lado da cidade.
Desencanei de tentar explicar a minha relação com o São Paulo. Conto histórias, compartilho o que já vivi com o time e pelas arquibancadas. Deixo os outros chegarem às próprias conclusões. Sempre me acho patético quando tento racionalizar o que é passional.
Vivi boa parte das emoções mais intensas da minha vida graças ao futebol. Não falo só de alegrias cada vez mais raras e das tristezas frequentes nos últimos anos. Quando digo que cresci no estádio é porque a vida nas arquibancadas me colocou em contato com uma variedade enorme de sentimentos experimentados em diferentes escalas, muitas vezes nos momentos mais improváveis possíveis.
Num Morumbi lotado, ficou gravado na minha memória o esforço coletivo para fazer com que um cadeirante flutuasse sobre toda a torcida até chegar ao lado da bateria, só para citar um exemplo admirável. Não é por acaso que hoje, um tanto afastado dos estádios, sonho que estou tomando chuva ou torrando no sol sobre aqueles degraus de concreto. A vida de torcedor extrapola o que se passa no gramado. Muitas vezes o que rola no jogo é só um detalhe. Um dia escreverei com mais calma a respeito disso.
Se é impossível me dissociar dos livros e da literatura, também não há como sacar quem sou sem levar em conta essa relação com o São Paulo, com o futebol e, numa chave mais ampla e menos afetiva, com o esporte. Escrevo tudo isso porque esta semana tem sido um martírio. O tempo parece ter parado. Já se passaram três meses desde o final do jogo do último domingo. Talvez ainda faltem uns 5 meses para chegarmos no próximo domingo, depois de amanhã.
Será a chance de ter um segundo acerto de contas com o meu eu do passado. Ganhamos o primeiro jogo por 1X0. Agora, em casa, só não perder para ficarmos com a taça. Levar a Copa do Brasil será uma oportunidade para, enfim, remediar um pouco de toda dor que senti - e às vezes ainda sinto - com a final desse mesmo torneio em 2000. Pouparei detalhes para não reavivar aquela desgraça que aconteceu no Mineirão.
Na reta final da escrita de “A Biblioteca no Fim do Túnel: Um Leitor em Seu Tempo”, mandei para a Arquipélago uma versão do texto com um colofão nada protocolar. Uma graça, um desabafo, também uma mensagem que gostaria de deixar registrada. Se tudo der certo - e confio que dará -, precisarei rever esse colofão.
Para as próximas edições (mais uma vez, se tudo der certo), será uma satisfação enorme pensar num novo colofão, desta vez festivo, para “A Biblioteca no Fim do Túnel”. Porque na vida, na minha vida, futebol e literatura andam juntos.
Por falar no livro…
“A Biblioteca no Fim do Túnel: Um Leitor em Seu Tempo” segue encontrando os seus bons leitores.
O Xico Sá, generoso que só, curtiu:
Além do site da Arquipélago, “A Biblioteca no Fim do Túnel” já está disponível em diversas livrarias: da Vila, da Travessa, Martins Fontes, Amazon…
A Lucianna Borges também gostou do que leu:
Maringá
No próximo dia 6 passarei por Maringá para participar da 10ª edição da Flim, a festa literária da cidade.
Estarei ao lado do camarada Rogério Pereira, criador do jornal Rascunho e que acaba de publicar “Antes do Silêncio” (Dublinense), na mesa “Os livros e eu: uma conversa sobre quem lê e fala sobre literatura”.
O papo acontecerá às 9h da manhã e será comandado pelo colega jornalista Victor Simião.
Apareçam!
Uma ideia que pintou
Outro dia compartilhei com vocês alguns planos para o futuro da newsletter e pedi para que mandassem sugestões. Uma das enviadas já ocupou um bom lugar nos meus planos.
Um leitor considerou que seria excessivo termos encontros mensais num clube de leitura. Há quem precise de mais tempo para dar conta de certos livros, argumentou, o que acho razoável. Outro sugeriu que também tivéssemos encontros descompromissados, para trocarmos ideias sobre literatura, sobre cultura, sobre a vida.
Daí que agora penso no seguinte: quando implementar o clube, termos encontros a cada dois meses para discutir livros específicos. Entre um mês e outro, marcamos um dia para papear de forma mais livre, com pegada de mesa de bar mesmo. O que acham?
Como há leitores de diferentes cidades pelo país, esses encontros serão virtuais.
Sugestões seguem bem-vindas :)
Paguem o cachê
“Uma vez que se trata de um evento cultural de negócios, com altas cifras circulando, incentivos governamentais suntuosos, ingressos pagos, uma megaestrutura de logística, tudo de primeira, é preciso pagar cachê aos escritores convidados, como tem sido a prática de quase todos os eventos no país. Escritor feliz é escritor lido e tratado como profissional que, afinal de contas, está também prestando um serviço”.
Destaco esse trecho do artigo que o escritor, curador e gestor de projetos literários Henrique Rodrigues escreveu para o PublishNews sobre a Bienal do Livro do Rio de Janeiro. Também vale dar atenção para o momento em que ele fala de termos políticas de Estado permanentes para a formação de leitores e incentivo da leitura.
☕ Um café
Há algumas semanas estive em Cruzeiro para ministrar uma oficina de Jornalismo e Literatura na festa literária da cidade. A passagem foi bem rápida, mas deu tempo de garimpar um bom café de uma torrefação local, a Panteão.
Quando passei por lá só tinham um café pronto para a venda. Era um bem digno, pelo menos, e estava bem fresco (a torra era recente até demais, na verdade). Vale a visita para quem for da região ou estiver pelos arredores.
📢 O que mais rolou na Página Cinco
📝 Cinco livros assombrados pelo 11 de setembro chileno.
📝 A literatura viva, os números e o tal bookstan: notas sobre a Bienal.
🎙️ A crônica segue viva : papo com Cidinha da Silva:
📝 Uma trans entre os mitos gregos, a Cuba revolucionária e a guerra em Angola: resenha de “Me Chama de Cassandra”, de Marcial Gala (Biblioteca Azul).
📝 Filmes, legado, revisões da obra… e Agatha Christie segue em evidência.
Vai dar certo e dessa vez a raiva irá embora. Boa sorte!
Quando você começou a falar sobre o São Paulo, logo pensei "com certeza tá ansioso com essa semana separando os dois jogos" e acertei! hahahaha