“Dizem que na Inglaterra as crianças nigerianas têm duas mães - a mãe que põe no mundo e a mãe social. Nem bem se dava conta de que estava esperando um filho, em vez de comprar um carrinho de tricotar sapatinhos, a dona de casa nigeriana publicava um anúncio procurando uma mãe adotiva. Ninguém se preocupava em saber se a mãe era ou não adequada, ninguém queria saber se sua casa era limpa ou não; a única preocupação de todas era que a mãe adotiva fosse branca. O conceito de ‘brancura’ acobertava um sem-número de pecados”.
Desta vez escrevo com dois objetivos. O primeiro é, se ainda não o fez, sugerir que você leia a literatura de Buchi Emecheta. O segundo é que se junte ao Clube de Leitura da Página Cinco justamente para conversar sobre a autora.
Sobre “Cidadã de Segunda Classe”, mais especificamente, de onde tirei o trecho acima. O livro saiu no Brasil em 2018 pela Dublinense traduzido por Heloisa Jahn.
Buchi nasceu em 1944 em Lagos, capital da Nigéria. Passou parte da infância em Ibuza e depois voltou para a cidade natal, onde estudou numa escola de elite graças a uma bolsa.
Sua vida foi dura. Casou aos 16 e, pouco depois, mudou-se com o marido para Londres. Viveu na Inglaterra por cerca de 50 anos, onde morreu no começo de 2017.
Mais ou menos nessa época, começou a ganhar admiração de uma boa quantidade de leitores brasileiros. Seus livros por aqui já venderam cerca de 150 mil exemplares. Fez sucesso principalmente com “As Alegrias da Maternidade”, mas toda a obra de Buchi vale a pena.
A violência contra as mulheres, as engrenagens sociais que massacram certos sujeitos, as imposições culturais e as diferentes formas de compreender a existência neste mundo são traços da literatura da autora.
Tanto a vida na Nigéria quanto na Inglaterra aparecem em romances marcados pelas tensões culturais. São atritos e confluências entre diferentes povos que ocupam o território nigeriano ou entre europeus e africanos.
Essa tensão alcança o centro do império quando os cidadãos dos países invadidos passam a procurar outras possibilidades para a própria vida. Essa é uma das camadas mais interessantes de “Cidadã de Segunda Classe”.