O ótimo momento das autoras mexicanas
Fernanda Melchor e Cristina Rivera Garza puxam a fila por aqui
Opa, tudo bem?
Aqui, Rodrigo Casarin. Sou jornalista e vivo entre livros.
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É hora de lermos autoras mexicanas
Em 2021, escrevi para o Rascunho um artigo que depois publiquei na coluna do Uol. Nele, constatava o ótimo momento de escritoras argentinas que apostam no caos psicológico e em diferentes camadas de horror.
Desde então, Mariana Enriquez conquistou um admirável público por aqui. Ariana Harwicz atormentou uma quantidade importante de bons leitores. Samanta Schweblin, enfim, começou a receber toda a atenção que merece. Selva Almada, bem editada, ainda está para explodir, creio. E Laura Alcoba foi traduzida para o português, bom começo para ser descoberta.
Vinha pensando em escrever artigo semelhante apontando para o ótimo momento da literatura mexicana feita sobretudo por mulheres. “Temporada de Furacões”, de Fernanda Melchor, esteve entre minhas melhores leituras de 2021. Também da autora publicada pela Mundareú, “Páradais” talvez entrasse em lista semelhante no ano passado, caso não tivesse abandonado o hábito de fazer essas relações.
Nessa suposta lista, certamente teria espaço para uma outra mexicana: Cristina Rivera Garza com “O Invencível Verão de Liliana” (Autêntica Contemporânea), livro tão duro quanto belo sobre um caso de feminicídio na família da própria autora. A promessa é que outro livro de Cristina saia por aqui neste ano, no segundo semestre: “Autobiografia do Algodão”.
É admirável a forma como Cristina passeia por entre gêneros dentro de uma mesma obra. Já Fernanda é de uma intensidade rara, dona de uma prosa que exige fôlego do leitor. Em comum, ambas exploram questões caras à atual literatura latino-americana: as tragédias sociais e a violência de gênero.
Como disse, considerava escrever algo semelhante ao que fiz com as argentinas. Ainda cogito. Mas o caderno Pensar, do Estado de Minas, tomou a dianteira e fez um especial: reuniram Cristina, Fernanda e Brenda Navarro, que está na minha fila para ser lida. Aliás, vale muito acompanhar o trabalho que o Pensar, sob batuta do ótimo Carlos Marcelo, tem feito sobre literatura.
Lembro de mexicanas que me causaram boa impressão num passado mais ou menos recente: Jennifer Clement, de “Reze Pelas Mulheres Roubadas” (Rocco), e Elena Poniatowska, de “Querido Diego, Sua Quiela” (Mundareú). Há outras que, sei, merecem atenção - Guadalupe Nettel e Margo Glantz, por exemplo.
E vocês, indicam boas autoras mexicanas contemporâneas para escalarmos nesse time?
Indígenas: a barbárie segue seu curso
É incrível essa história de como uma família salvou um idioma indígena dado como extinto ao longo de décadas pela Argentina. A matéria é da Radio Ambulante, um dos meus podcasts favoritos. É em espanhol, mas vale o esforço para tentar acompanhar narrativas sempre bem lapidadas.
Não é segredo: o país vizinho também massacrou, dizimou e depois apagou diversos povos e culturas indígenas ao longo de seu sanguinolento processo “civilizatório”. Este episódio do Hora Americana é uma boa para quem quer saber mais a respeito.
Ao escutar ambos, lembrei um dos grandes livros argentinos publicados por aqui nos últimos anos. Nele, mitos fundadores da nação ganham novas cores e encontros nos fazem pensar sobre rumos que a história poderia ter tomado. Falo de “As Aventuras da China Iron”, de Gabriela Cabezón Cámara (Moinhos).
A história deste canto do mundo possui similaridades e a marcha da barbárie prossegue. Não poderia deixar de pensar também num genocídio em curso, o dos Yanomamis. Saiu no Meio essa dramática entrevista com Junior Yanomami, líder dos indígenas em Roraima.
☕️ Um café
A Crio tinha preços que chegavam a comover antes do valor do café disparar em todo o mundo. Ainda assim, a cafeteria segue com opções bem boas, que se garantem na relação custo-benefício. Esse Torta de Limão, mistura de catuaí amarelo e vermelho de uma fazenda do sul de Minas, me agradou bastante.
📚 O que chegou por aqui
Já pipocou aqui e ali elogios de gente que respeito a “Luminol”, de Carla Piazzi, que estreia no romance com um catatau de 528 páginas. A editora, a Incompleta, apresenta a obra como um “luto labiríntico, uma perspectiva inusitada do século 20 em diário, um romance detetivesco e polifônico cujas substâncias são o amor e a morte”. A atenção chamou, vamos ver quando terá vez na caótica sequência de leituras.
📚 O que vem por aí
A Pinard passa o chapéu para publicar “Huasipungo”, de Jorge Icaza, obra fundamental da literatura equatoriana e que também trata de questões indígenas. A capa da edição dialoga com uma pintura do também equatoriano Oswaldo Guayasamín, dono de quadros de rara dramaticidade, como o que está algumas linhas acima.
📚 O que poderia vir (alô, editoras!)
Chamou a minha atenção esse vídeo sobre “Volver a Cuándo”, de María Elena Morán, venezuelana radicada no Brasil. O título foi publicado pela Ediciones Siruela, da Espanha. Me causou boa impressão o romance que já li da autora: “Os Continentes de Dentro”, lançado pela Zouk.
🥂 Um vinho
Espumante não é só para celebrações pretensamente pomposas. Vai bem sempre, ainda mais no calor que tem feito aqui em São Paulo. Dou valor à linha Ouro, da Salton: vinhos agradáveis, com certa complexidade e que podem ser achados por menos de 50 reais - pago menos de 40 aqui perto de casa. Brut ou extra brut, branco ou rosé: escolha o que preferir, não tem erro.
📢 O que mais rolou na Página Cinco
📝 “Todo Dia a Mesma Noite”: vale a pena ler o livro de Daniela Arbex que deu origem à série da Netflix?
📝 Resenha de “A Irmã Menor”, de Mariana Enriquez (Relicário), uma mistura de ensaio biográfico com análise da obra literária de Silvina Ocampo.
🎙️ Erros e acertos na medicina, a permanente busca pelo conhecimento, a relação com a corrida de rua… Papo com Drauzio Varella.
📝 “A Estrada”, de Cormac McCarthy (Alfaguara), como sugestão de leitura para quem está curtindo a série (ou já curtiu o jogo) “The Last of Us”.
📝 “Aniquilar”, livro com o qual Michel Houellebecq (Alfaguara) promete encerrar sua obra, é um romance quase fofinho.
🎙️ Os interesses como leitora crítica, formas de trabalhar as cenas de sexo, a Academia Brasileira de Letras… São assuntos do papo com Conceição Evaristo.
📝 Falência da Livraria Cultura: as boas lembranças dos leitores contrastam com as rasteiras em editoras e funcionários.
📖 “A maior parte do que sei sobre escrever, aprendi correndo todos os dias. São lições práticas, físicas. Até onde posso me forçar? Quanto descanso é apropriado - e quanto é demais? Até onde posso levar alguma coisa e ainda assim mantê-la decente e consistente? Quando uma coisa se torna tacanha e inflexível? Quanta consciência do mundo exterior devo ter, e quanto devo me concentrar em meu próprio mundo interior? Em que medida devo ter confiança em minhas capacidades, e quando devo começar a duvidar de mim mesmo? Sei que se eu não tivesse me tornado um corredor de longa distância quando me tornei romancista, minha obra teria sido vastamente diferente. Quão diferente? Difícil dizer. Mas alguma coisa definitivamente teria sido diferente” - Haruki Murakami em “Do que Eu Falo Quando Eu Falo de Corrida” (Alfaguara, tradução de Cássio de Arantes Leite).
Tava guardando essa edição pra ler e quase perdi pq acumulei muitas News. Adorei que vc abriu com a remédios, que baita artista! Ainda não li nenhuma das autoras que citou, tô pra começar já já, vou procurar por elas nas bibliotecas de SP. Ah! E essa citação do Murakami ❣️
Estou cada vez mais interessada em ler autoras latinoamericanas e você sempre me mantém a par do que vale a pena. Adorando acompanhar o Página Cinco aqui também!