Sim, irei repetir uma indicação aqui no Da Biblioteca. É uma edição excepcional.
Não há outro assunto. Impossível ignorar o horror vivido pelo Rio Grande do Sul. Aliás, antes de qualquer coisa, fiquem com meu abraço leitores que vivem no estado ou que têm família e amigos por lá. Desejo força para esse momento terrível.
Passei a semana vendo notícias dantescas e acompanhando como estão amigos e conhecidos que vivem em cidades tomadas pela água. São sobretudo escritores, editores, professores, leitores, gente do mundo dos livros.
Dentre os muitos lugares destruídos está Livraria Taverna. Ela fica no térreo da Casa de Cultura Mario Quintana, bem no centro histórico da capital gaúcha:
Sobra tristeza, desolação, sensação de impotência.
Eliane Brum levava as ruas porto-alegrenses e de cidades próximas para os breves perfis escritos para o jornal Zero Hora no final da década de 1990. São retratos que capturam muito do que há de essencial nos seres humanos, por isso permanecem de pé.
Escritos há mais de duas décadas, também são testemunhos de uma Porto Alegre que já se foi. Não há como pensar de outra forma enquanto o planeta esfrega nas nossas fuças as consequências da anomalia climática provocada pelo homem.
Com o olhar perspicaz para captar o extraordinário onde quase todos enxergam apenas o banal, Eliane reúne em “A Vida que Ninguém Vê” (Arquipélago) uma coleção admirável de personagens. Estão ali a Dona Maria em busca de, enfim, conseguir estudar e o Adail, trabalhador do aeroporto que sonhava com o dia em que poderia andar de avião.
O aeroporto de Porto Alegre está debaixo d’água.
Penso na minha história preferida do livro. Vanderlei não tinha grana nem para um cavalo como o Caramelo, resgatado nesta quinta de cima de um telhado. Mas tinha imaginação. Ia para uma feira de agropecuária montado num cabo de vassoura, o seu cavalo-de-pau. Idiotas da objetividade costumavam chamá-lo de louco.
Não havia loucura nenhuma. Perguntado sobre seu cavalo fictício, o homem respondeu para Eliane: “Sem invenção a vida fica sem graça. Fica tudo muito difícil”.
Precisaremos de doses gigantescas de imaginação e invenção para tentarmos mudar o que já estamos vivendo.
Da Biblioteca: "A Vida que Ninguém Vê", de Eliane Brum (Arquipélago)
Rodrigo, hoje mais uma notícia triste. A água alcançou a sede da editora LPM e perdeu-se quase um milhão de livros.
que tristeza…