“Teria sido preciso mais lágrimas e súplicas, uma representação melhor do meu desespero real, para que ele entendesse meu desejo de abortar… Não pronunciamos nenhuma vez a palavra aborto, nem ele nem eu. Era uma coisa que não tinha lugar na linguagem”.
Após a Câmara se assanhar para fazer com que nossas leis sejam ainda mais retrógradas em relação ao aborto, muitos se lembraram de “O Conto da Aia”, distopia de Margaret Atwood (Rocco, tradução de Ana Deiró).
Na quarta, na coluna no Uol, escrevi sobre “Catedrais”, romance de Claudia Piñeiro (Primavera Editorial, tradução de Marcelo Barbão) que também dialoga com o tema. Mas o livro que me veio mesmo à cabeça quando essa nova fase do nosso obscurantismo começou a rolar foi “O Acontecimento”, de Annie Ernaux.
É da tradução de Annie feita por Isadora de Araújo Pontes e publicada pela Fósforo que retirei as aspas acima. Conectando a própria história com as questões sociais de seu entorno, em “O Acontecimento” a francesa escreve sobre o aborto clandestino que fez na juventude.